MATERIAL DE APOIO - CIÊNCIAS SOCIAIS



       Nós, enquanto estudantes de Ciências Sociais, independentemente do ano de ingresso, às vezes (quase sempre) paramos para pensar: "Afinal, pra que serve o curso de Ciências Sociais?"


       Para o CORECS 2011 (Conselho Regional de Estudantes e Entidades de Base de Ciências Sociais), preparamos o material abaixo, como uma pequena síntese de alguns temas que permeam nossa formação enquanto cientistas sociais!


Currículo: formação e prática
Sociologia Ensino Médio
Cientista Social como Profissional
Democratização dos espaços no Ensino Superior
- O que é e para quê aprendemos o que aprendemos
- Separação entre as três áreas (falta de interdisciplinaridade e diálogo entre as áreas, estrutura institucional)
- Maior relação com o campo de trabalho
- Extensão como um “elo fraco” do tripé
- Falta de “pesquisa-ação”
- Falta da pesquisa na Licenciatura
- Experiências escolares no fim do curso
- Academia e mercado de trabalho (a não ser o da pesquisa) não se conversam
- Atuação junto à sociedade = Destinação do conhecimento produzido as comunidades / localidades estudadas
- Formado em Ciências Sociais é considerado sociólogo, não cientista social
- Necessidade de pós-graduação para ser antropólogo e cientista político
- Abertura e Horizontalidade dos espaços
- Maior participação nos espaços políticos da Universidade
- Paridade nas instâncias decisórias





Currículo: formação e prática

Não é de hoje que os estudantes do curso de ciências sociais da UFRGS questionam-se sobre sua formação acadêmica/profissional. Que tipo de cientista social nossa atual formação desenvolve? Que tipo de cientista social gostaríamos de ser/formar?
O tripé fundamental da universidade, ensino-pesquisa-extensão, encontra-se "perneta". Sofremos com a inexistência de projetos de extensão que apresentem propostas de conexão entre o conhecimento criado na academia e o meio a onde a mesma se localiza. Deixando assim uma lacuna na formação prática de seus estudantes, que se formam sem obter contato com nenhuma realidade ah não ser a da própria academia.
Há cerca de dois anos, o curso sofreu uma grande mudança, a retenção dos alunos (grande número de alunos que não concluem o curso), os departamentos (antropologia, ciência política e sociologia) decidiram-se por “recriar” o currículo do curso, diminuindo sua carga de créditos obrigatórios, encurtando assim o caminho do aluno em sua 'especialização' e, consequentemente, acelerando sua entrada no mercado de trabalho. Tendo a resistência dos discentes frente a proposta anterior de divisão do curso, não houve muito diálogo entre alunos e universidade (a não ser presença de discentes em reuniões da comissão de reforma curricular, após pressão dos próprios alunos). Grande parte das discussões recaia em "o que entra" "o que sai" "o mínimo de carga horária obrigatória por lei" ao invés de se perguntar "qual vai ser o cientista social que formaremos com esse tipo de curso?" "para quais tipos de atividades e quais formas de atuação será preparado o futuro cientista social?". Desta forma, o curso atualmente acaba formando técnicos parcialmente instruídos, que não são capazes de criar os pontos de dialogo entre as diferentes “áreas de conhecimento” que as Ciências Sociais abrangem, muito menos entender sua relação com outras áreas das Ciências Humanas.
Como se isso não fosse o bastante, a contradição se agudiza ao nos adentrarmos na tornarem professores/pesquisadores dentro da própria academia não recebem nenhuma instrução em como se cria conhecimento dentro de uma sala de aula.
Entendemos que o curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul esta orientado para servir as necessidades de mão de obra do mercado (de pesquisadores reprodutores de conhecimento), e pouco interessado na formação de cientistas sociais críticos, criadores e capazes de intervir na realidade objetiva.



Cientista Social como profissional



O que farei ao concluir o curso? Onde trabalhar? Essas duas perguntas estão, estará ou já esteve na cabeça de um estudante universitário, na ciências sociais não é diferente. De maneira sucinta apresenta-se aqui alguns campos no qual a atividade poderá ser exercida, por exemplo: Acadêmico, atuando como professor e pesquisador em universidade; no magistério, como professor de sociologia no ensino médio; Em instituições governamentais, no planejamento de políticas públicas e em órgãos de pesquisas como, IBGE, IPEA, INEP, FEE/RS; no poder judiciário, sobretudo no ministério público, como analista de pericial; como assessor no poder legislativo; em organizações não governamentais e sindicatos; em empresas de pesquisa de mercado ou eleitoral. Não serão demonstradas aqui as atribuições de cada área, pois são bem amplas e complexas. Mas no âmbito acadêmico, por exemplo, articular as diretrizes da universidade (ensino, pesquisa e extensão), que na realidade poucos profissionais atuam com esta perspectiva, seria uma forma de contribuir tanto na formação permanente do cientista social, como na execução da atividade científica e propiciando a comunidade externa retornos efetivos.
Contudo, cabe ao cientista social para além de sua atuação ter compreensão do momento histórico no qual está inserido, entendo assim, a necessidade de um processo crítico de análise conjuntural para organizar e definir suas ideias, elaborando estratégias concernentes aos acontecimentos contemporâneo e cotidiano que o circunda, pois independente da atividade exercida, do espaço em que esta será colocada em prática o estudante/profissional de ciências sociais tem que questionar, tencionar, analisar a sociedade nesta sucessão sistemática de mudanças de forma a compreender de fato seus fenômenos, não na superficialidade, mas buscar na gênese os seus porquês.  



Sociologia no Ensino Médio



Todo o estudante de licenciatura em Ciências Sociais já passou por alguns/muitos dilemas e angústias. Tais inquietações são resultado muitas vezes ou de nossa formação acadêmica ou das expectativas com a atuação no mercado de trabalho.
Sentimos a necessidade de ter uma prática docente muito antes das cadeiras do Estágio, afinal, é a prática em sala de aula que significa os conhecimentos que apreendemos ao longo do curso de Ciências Sociais: como aprender ser professor de Sociologia apenas dentro da academia sem a mínima noção de como são as realidades escolares?
Afinal, o que a gente aprende enquanto teoria nas Ciências Sociais, não é necessariamente o que ensinamos, o que é a famosa transposição, ou seja, a “tradução” dos saberes acadêmicos para o entendimento dos educandos; uma transposição que muitas vezes só será aprendida com a falta de compreensão dos alunos com uma proposta de trabalho, sendo assim, novamente, com a prática (sabemos muito bem o “o que” e “por que” mas ainda falta muito o “como”).
Além disso, se formar enquanto professor de “Sociologia” não excluiu a necessidade de conhecimento nas três áreas da Ciências Sociais, na verdade, são fundamentais para uma visão consistente da sociedade. Se formar enquanto professor não excluiu a “pesquisa”, não existe oposição entre ensino e pesquisa, quem ensina precisa pesquisar e poderá/deverá utilizar da pesquisa para o aprendizado e quem pesquisa está ensinando alguma coisa com o seu estudo, portanto, é necessário valorizar a pesquisa na licenciatura, é combinar prática docente com exercícios de pesquisa e produção de conhecimento.
Portanto, nossa formação enquanto professores de Sociologia precisa organizar esse processo dinâmico que é articular o aprendizado da teoria das três áreas da Ciências Sociais na e para prática docente (saber entender a realidade que se insere, o que pode ser importante ensinar, como ser acessível e ao mesmo tempo complexificar o entendimento do educando sobre o mundo) ressignificando tais saberes por causa da prática e utilizar a pesquisa como forma de produzir conhecimento tanto para o estudante universitário aprender, quanto para o futuro professor utilizar de ferramenta de ensino.
E junto com tudo isso, há os problemas da inserção do licenciado no mercado de trabalho. A falta abertura de vagas para Sociologia nos concursos públicos para a educação básica, os problemas para se inserir na rede privada (seleção é realizada em grande parte por indicações) e a dificuldade de atuação em espaços não-formais de educação (já que durante a graduação isso nem é incentivado ou preparado).
A Licenciatura em Ciências Sociais tem de ser revista para melhor preparar seus estudantes, precisa pensar o contexto educacional que tenta se inserir, além de buscar os mecanismos de organização para a atuação nessas questões seja dentro da Universidade (CAs/Das, conselhos, comissões, departamentos, colegiados...) e/ou fora (sindicatos, movimentos sociais...).



Democratização dos espaços no Ensino Superior



Os três pontos anteriormente descritos (Currículo - formação e prática, o Cientista Social como profissional e a Sociologia no Ensino Médio), preenchem a série de fatores adjacentes a nossa formação enquanto discentes em Ciências Sociais. Porém, nosso processo de formação (e a nossa futura atuação) esta diretamente ligada a reprodução de uma Universidade retrograda, fechada, onde os processos decisórios e políticos ainda são viciados e baseados na representação como forma democrática pré-estabelecida.
Verifica-se, inferindo a partir das evidências adquiridas enquanto estudantes de ciências sociais da UFRGS, tal ligação por meio de diversos aspectos, entre eles: a) lógica mercadológica da produção acadêmica - através dos estímulos e superinvestimento em pesquisa, que acaba por excluir extensão das prioridades para uma formação acadêmica de qualidade ao limitar o número de programas e projetos nessa área, b) que por sua vez, leva a um vácuo entre o que é produzido e a realidade social - pois, a quantidade de trabalhos produzidos ainda esta acima da qualidade e aplicabilidade dos mesmos, como se a teoria fosse totalmente descolada do contexto social onde estamos inseridos; c) a desproporção na escolha dos dirigentes e nos conselhos deliberativos da universidade - tanto nas votações para reitor e nas decisões tomadas dentro dos departamentos (por exemplo, nas reuniões do CONSUNI - conselho de unidade - onde há indicação de apenas um estudante como representante dos discentes, por curso), quanto na baixa participação dos estudantes nas instâncias institucionais, consideradas formais e burocratizadas, d) onde acaba culminando na falta de espaços reais de discussão entre os estudantes e a universidade, pois o objetivo da mesma é a reprodução de conhecimento adquirido, não o dialogo e apresentação de propostas, considerando assim os estudantes apenas como ratificadores das decisões ao nomear seus representantes, e) reflexo também na falta de mobilização dos estudantes ao compreenderem que as entidades de base (os centros acadêmicos, por exemplo) atualmente, apenas reproduzem o sistema político vigente, não os vendo como um possível espaço de criação e apropriação de pratica social e política.
No entanto, algumas características supracitadas estão presentes no debate acadêmico referente a descrença dos cidadãos em relação a instituições burocratizadas como o Estado, o que leva estudiosos a identificar uma crise de representatividade. Porem, estes estudos pertinentes para analisar instâncias políticas e representativas em setores como os que se desenvolvem nas universidades ainda são pouco difundidos entre os estudantes, onde temas como democracia participativa e deliberativa não são transpostos para a realidade da organização estudantil nem da própria instituição UFRGS.
Face a isso, medidas para contribuição da real democratização dentro da Universidade devem ser levadas em consideração. Os processos democráticos alternativos à democracia representativa, visam ampliar a participação da população no campo político, incluindo a sociedade civil, seja na formulação de agendas políticas, na deliberação e a efetivação de projetos, quanto na igual proporção de valor nas decisões dentro da universidade.
Portanto, cabe aos estudantes em geral o comprometimento com a tarefa mais difícil: mobilização em torno de um projeto de ação coletiva! O histórico do movimento estudantil de Ciências Sociais, deixa a desejar, porem já e hora da haver uma real articulação entre nós, através da abertura e utilização dos espaços para discussão de temas relevantes a nossa formação acadêmica, que refletirá em nossa formação social e profissional. Sejam estes temas uma maior horizontalização na organização e participação nos espaços políticos da Universidade, seja na exigência do direito a representação paritária de docentes, servidores e estudantes nas deliberações da instituição.